18/01/2023 às 20:48

Estão gritando. Você consegue ouvir?

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Fui atraída pelos seus gritos. De blusa rosa, não devia ter mais que 10 anos de idade. "Não, não! Por favor, por favor!" "Socorro!" "Me ajuda!" Os gritos não chamaram apenas a minha atenção, mas também de outros que passavam pela praça de alimentação do shopping. Agarrado à menina estava um menino. Talvez, irmão, talvez dois anos mais velho. Talvez culpado, mas talvez inocente, qualquer que fosse a acusação.

Tão chocante quanto presenciar os gritos, foi enxergar com meus próprios olhos a crueldade do que causava essa reação. As mãos dos 4 seguranças que os cercavam pareciam desnecessariamente desproporcionais ao tamanho das próprias crianças. O que elas haviam feito, imagino, estava em desacordo com as regras de convivência da burguesia frequentadora do Iguatemi. Mesmo sem descobrir o que causara tal intervenção, me aproximei para sair em defesa daqueles que, fossem culpados ou inocentes, certamente seriam punidos de forma também desproporcionalmente severa. De tanto assistir ao filme do preto, pobre agredido em público, de imediato me preparei para presenciar, ao vivo, a gravação de uma nova versão.

Apesar de essa situação me fazer pensar que a humanidade, realmente, deu muito errado, me deixou com uma pontinha de esperança saber que não fui a única a se aproximar e se preparar para intervir. Ouvi outras vozes, ao meu lado, que diziam: "vai com calma, vai com calma!", para os seguranças. Acredito que somente as súplicas dos poucos que tiveram coragem de "meter o bedelho" foram as ferramentas que evitaram que fossem ainda mais rudes com os "intrusos".

Em que momento passamos, todos, a excluir dos espaços comerciais os que não detêm poder de consumo? Em que momento a injustiça social deixou de ser um absurdo, algo que fere olhos, ouvidos e coração, para se tornar um defeito e um indicativo de que alguém não é digno de estar em certos lugares?

Saio do shopping com nada mais do que esse questionamento, acompanhado dos gritos que ainda ecoam na minha cabeça. Registro ainda que tal fato aconteceu em torno das 17:00h do dia 18 de janeiro de 2022, entre as lojas da praça de alimentação. As crianças foram arrastadas por uma daquelas portas de "entrada somente para pessoal autorizado". Atrás delas, uma mulher, empurrada pela nuca, as acompanhou. As portas se fecharam, o público, parte em choque, parte apoiando a abordagem, seguiu sua vida. Dois seguranças garantiriam que ninguém passaria por aquela entrada/saída para descobrir o que aconteceria.

Precisamos, com urgência, descobrir onde erramos...

18 Jan 2023

Estão gritando. Você consegue ouvir?

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capitalismo desigualdade injustiça pobreza política socialismo sociedade

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